A Comissão Europeia prepara o anúncio de uma nova rodada de sanções contra as big techs, com base na Lei de Mercados Digitais (DMA). As empresas Google (Alphabet), Meta (Facebook, Instagram, WhatsApp) e Apple devem ser multadas por práticas anticompetitivas que vão desde favorecimento de produtos próprios até barreiras à interoperabilidade com concorrentes.
Fontes ligadas ao executivo europeu afirmaram ao Globo que os valores das multas podem ultrapassar 9 bilhões de euros, somados entre as três empresas. A decisão representa a primeira aplicação prática da DMA desde sua entrada em vigor em março de 2024.
— O que está em curso é um ajuste de rota. O que era faroeste digital está se transformando em regulação de fato — afirma o advogado Thomas L. Bernard, especialista em direito internacional e consultor da Comissão Europeia.
As infrações das gigantes
As acusações se concentram em três frentes principais:
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Google: supostamente continua a favorecer seus próprios serviços nos resultados de busca e impede concorrentes de operar com as mesmas condições de visibilidade.
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Meta: é investigada por exigir que empresas aceitem políticas de compartilhamento de dados entre plataformas, mesmo que não integrem o ecossistema completo.
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Apple: teria mantido restrições à instalação de aplicativos fora da App Store e dificultado a operação de sistemas de pagamento de terceiros em seus dispositivos.
Pela DMA, plataformas consideradas “gatekeepers” — ou seja, controladoras de fluxos centrais da economia digital — precisam garantir concorrência justa, interoperabilidade e liberdade de escolha ao consumidor.
Reação das empresas
Em nota, as três companhias se defenderam. A Google afirmou que colabora com as autoridades e “está ajustando suas práticas em conformidade com a nova legislação”. A Meta reiterou que “suas plataformas oferecem liberdade de configuração e respeitam a privacidade do usuário”. A Apple disse que “trabalha para garantir segurança digital e não prejudicar o ecossistema de inovação”.
Apesar disso, as ações das três empresas recuaram nas bolsas globais nesta quinta-feira. O impacto imediato foi de queda média de 2,7% nos papéis das gigantes, segundo a Nasdaq.
Impacto global e reflexos no Brasil
Especialistas consideram a atuação da União Europeia como precedente internacional que pode acelerar legislações semelhantes em outras regiões. Nos Estados Unidos, o tema voltou ao centro do debate com a campanha de reeleição de Donald Trump. Segundo interlocutores do Partido Republicano, Elon Musk tem atuado nos bastidores para desmontar a regulação digital proposta durante o governo Biden — o que pode ser um entrave caso o bilionário entre oficialmente na administração trumpista.
Para o jurista brasileiro Ismael Ribeiro, doutor em direito digital, o impacto europeu deve chegar ao Brasil:
— A DMA é disruptiva porque altera a estrutura de funcionamento das plataformas. É provável que o Congresso brasileiro se inspire na regulação europeia para atualizar o Marco Civil da Internet e o PL das Fake News — afirma.
Segundo ele, há articulações entre parlamentares da base e da oposição para criar uma nova Comissão Mista de Regulação Digital após as eleições municipais de 2024.
Tendência de endurecimento regulatório
A regulação da economia digital entrou em um novo ciclo. A União Europeia já havia aplicado sanções significativas no passado — incluindo multas superiores a €4,3 bilhões contra a Google em 2018 e 2019 —, mas a DMA inaugura um modelo preventivo, que obriga ajustes antes que o dano ocorra.
Além da Europa, países como Austrália, Canadá e Índia já estudam legislações inspiradas no modelo europeu.
Para a economista e analista de tecnologia Marina Teixeira, o ciclo de inovação livre começa a dar lugar a uma fase de responsabilidade sistêmica das plataformas:
— Não se trata de sufocar as big techs, mas de lembrar que elas operam como infraestruturas públicas digitais. Há que se impor limites — diz.
O que está em jogo
Empresa | Infração apontada | Potencial de multa |
---|---|---|
Favorecimento próprio nos resultados de busca | €4,1 bilhões | |
Meta | Coleta e cruzamento compulsório de dados | €2,8 bilhões |
Apple | Barreiras à instalação externa de apps | €2,3 bilhões |
Próximos passos
A Comissão Europeia deve oficializar as sanções até 20 de maio, com direito a contestação por parte das empresas. A expectativa é que as plataformas apresentem recursos ao Tribunal de Justiça da União Europeia, mas terão que cumprir imediatamente as obrigações previstas na DMA.
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