Nova denúncia contra o ex-presidente inclui detalhes estarrecedores: plano previa morte de autoridades e uso da força para impedir posse de Lula. STF analisa responsabilização penal.
Por Fernanda Cappellesso I Brasília (DF) — Um novo e explosivo capítulo se abre nas investigações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), acusado de liderar uma trama golpista para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após as eleições de 2022. O relatório mais recente da Polícia Federal, entregue à Procuradoria-Geral da República (PGR) em março de 2025, revela que o plano teria escalado para ações extremas, incluindo o envenenamento de Lula e o assassinato do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.
As revelações constam da chamada “Operação Tempus Veritatis” e foram incorporadas à nova denúncia oferecida pela PGR ao Supremo Tribunal Federal (STF). As informações vieram à tona após cruzamento de depoimentos, áudios, mensagens cifradas e documentos apreendidos, além da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
O plano: “Punhal Verde e Amarelo”
O nome dado internamente ao plano radical foi “Punhal Verde e Amarelo”. Segundo os investigadores, tratava-se de uma estratégia dividida em três fases:
1.Desestabilização institucional com ataques ao sistema eleitoral;
2.Pressão sobre lideranças militares para adesão a um decreto de estado de sítio;
3.Caso fracassasse, execução de medidas extremas, como neutralizar fisicamente adversários políticos.
De acordo com o relatório, a expressão “neutralizar” aparecia em comunicações cifradas entre assessores e ex-ministros. A PF identificou um fluxo atípico de movimentações em áreas militares próximas ao Setor Militar Urbano, em Brasília, nas semanas que antecederam o segundo turno.
“Essa era a etapa final, de ruptura total. O plano envolvia logística, inteligência e articulação de células paramilitares ligadas a grupos civis e militares”, aponta um delegado federal com acesso ao inquérito, sob anonimato.
Envenenamento e morte: novas fronteiras do golpismo
O trecho mais sensível do relatório menciona a existência de uma lista de alvos prioritários, incluindo Lula, Moraes, o presidente do TSE à época, e parlamentares de esquerda. As intenções teriam sido discutidas em reuniões reservadas entre Bolsonaro e aliados civis e militares entre novembro de 2022 e janeiro de 2023.
A delação de Mauro Cid menciona “planos para interferir na posse através de ações táticas”, incluindo a administração de substâncias tóxicas a Lula, com o objetivo de atrasar ou inviabilizar a cerimônia de posse, e um plano de ataque à residência de Moraes.
“Bolsonaro foi informado dos riscos e, segundo Cid, teria dito: ‘Se é para salvar o Brasil, que seja agora ou nunca’”, revela o relatório.
A PF não identificou a efetiva preparação dos atos extremos, mas os estudos de viabilidade logística e as mensagens interceptadas configuram, segundo a PGR, crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito com agravantes.
O que diz a defesa de Jair Bolsonaro
Em nota enviada ao STF, a defesa de Bolsonaro negou “de forma veemente qualquer relação com planos de assassinato ou envenenamento”. Classificou os trechos do relatório como “ficção política” e afirmou que o ex-presidente “jamais atentaria contra a vida de adversários ou contra o processo democrático brasileiro”.
O próprio Bolsonaro se manifestou, durante evento no Mato Grosso, dizendo:
“Estão me acusando até de tentativa de homicídio. Daqui a pouco vão dizer que eu planejei a Segunda Guerra Mundial. Isso é perseguição!”
A defesa também protocolou pedido de anulação de provas oriundas da delação de Mauro Cid, alegando “pressão psicológica” e “acordo firmado sob coação institucional”.
Especialistas avaliam gravidade das novas revelações
Para o jurista Oscar Vilhena Vieira, professor da FGV Direito SP, os novos elementos colocam o caso em um patamar inédito:
“Não se trata mais de discurso golpista ou de minuta de decreto. Estamos falando de um suposto plano de execução de autoridades, com a participação de agentes do Estado. Isso rompe todas as fronteiras institucionais.”
A cientista política Beatriz Gonçalves, da UFRJ, avalia que a inclusão de práticas violentas na denúncia fortalece a tese de formação de organização criminosa com objetivos antidemocráticos.
“É o caso mais grave desde a redemocratização. A tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito pode gerar penas que, somadas, ultrapassam os 40 anos.”
STF analisa responsabilização penal e inelegibilidade
Com base nas novas provas, o STF pode abrir um novo processo penal específico para a fase radical do plano. Caso o tribunal entenda que há elementos suficientes, Bolsonaro pode responder por tentativa de homicídio, conspiração armada, associação criminosa e terrorismo.
A movimentação também reforça o debate sobre a inelegibilidade do ex-presidente, já decretada em outra instância, mas que poderá ser ampliada com base em novos julgamentos. Além disso, há possibilidade de pedido de prisão preventiva, caso a PGR entenda que há risco à ordem pública.
O Brasil diante do abismo institucional
A denúncia de que um presidente da República cogitou ou tolerou planos de eliminar fisicamente adversários políticos muda o eixo da crise institucional iniciada em 8 de janeiro de 2023. De uma ameaça difusa à democracia, o caso Bolsonaro assume contornos de um projeto sistemático de tomada violenta do poder.
Se confirmado em julgamento, o plano “Punhal Verde e Amarelo” poderá entrar para a história como o maior atentado contra a ordem constitucional brasileira desde o fim do regime militar.
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