Eleição começa no dia 7 de maio e reúne o colégio mais diverso da história da Igreja. Afastamento de cardeais influentes levanta debate sobre saúde, idade e poder político dentro do Vaticano.
VATICANO — O mundo católico vive dias decisivos com a aproximação de um novo conclave. Com início marcado para o dia 7 de maio, a eleição do próximo papa mobiliza 133 cardeais com direito a voto, que se reunirão na Capela Sistina, em Roma, para definir os rumos da Igreja Católica após a morte do Papa Francisco, ocorrida em 21 de abril. Esta será a escolha mais multicultural da história da instituição, com representantes de 71 países e uma média de idade de 69 anos entre os eleitores.
Ao mesmo tempo em que o colégio cardinalício se prepara, ausências de última hora revelam um cenário político e institucional delicado. Três nomes de peso não participarão do processo, e ao menos um deles, o cardeal italiano Angelo Becciu, representa um símbolo das divisões internas que o Vaticano tenta evitar escancarar durante o conclave.
Becciu: ausência que pesa no cenário político
A exclusão de Angelo Becciu, de 76 anos, ocorre após sua condenação por desvio de recursos da Secretaria de Estado do Vaticano em 2023, em um julgamento que ficou conhecido como o maior processo criminal da história moderna da Santa Sé. Apesar de manter o título honorário, Becciu teve seus direitos como cardeal suspensos ainda em 2020 por ordem do Papa Francisco e anunciou, no fim de abril, que não participaria do conclave por “respeito ao Santo Padre”.
A renúncia de Becciu reacende discussões sobre os limites da influência política e moral dos cardeais eleitores. Para parte dos analistas vaticanistas, sua ausência ajuda a evitar uma polarização maior durante as votações. Para outros, representa a perda de um voto influente entre os setores mais tradicionalistas da Igreja.
Saúde e idade afastam outros dois cardeais
Além de Becciu, dois outros cardeais informaram que não estarão presentes por motivos de saúde: o espanhol Antonio Cañizares, de 79 anos, ex-prefeito da Congregação para o Culto Divino, e o queniano John Njue, de 78, arcebispo emérito de Nairóbi. Ambos estão acima da idade limite para um próximo conclave, mas ainda poderiam votar neste, pois o corte é para quem completa 80 anos após o início da eleição.
Com essas ausências, o total de eleitores aptos caiu de 136 para 133.
Os nomes em evidência
Com um cenário complexo de transição e herança pastoral, dois nomes ganham força entre os favoritos à sucessão de Francisco: o cardeal Pietro Parolin, atual secretário de Estado do Vaticano, e o cardeal Matteo Zuppi, arcebispo de Bolonha.
Parolin é apontado como o nome da diplomacia, com forte articulação internacional e perfil moderado. Já Zuppi, ligado à Comunidade de Santo Egídio, tem o apoio de alas mais progressistas por sua atuação em temas sociais, imigratórios e de combate à pobreza.
Outros nomes citados em círculos internos incluem o cardeal filipino Luis Antonio Tagle, atualmente no Dicastério para a Evangelização, e o cardeal Jean-Claude Hollerich, de Luxemburgo, relator do Sínodo da Sinodalidade.
A mecânica do conclave
A eleição do papa ocorre sob um ritual secular. Todos os cardeais eleitores serão hospedados na Casa Santa Marta, dentro dos muros do Vaticano. A partir de 7 de maio, eles caminharão em silêncio até a Capela Sistina, onde prestarão juramento de sigilo e darão início às votações, que ocorrem duas vezes pela manhã e duas à tarde.
Cada escrutínio é secreto. Para que um novo papa seja eleito, é necessário o apoio de dois terços dos votantes — ou seja, 89 votos. Após cada rodada, os votos são queimados em uma estufa acoplada à chaminé da Capela Sistina. A fumaça preta indica votação inconclusiva. A fumaça branca, por sua vez, simboliza que um novo papa foi escolhido.
O novo pontífice pode ser qualquer homem batizado, mas, na prática, sempre é eleito um cardeal. Ao ser escolhido, o novo papa escolhe seu nome e é anunciado pelo protodiácono com a tradicional frase: Habemus Papam.
Uma Igreja em transformação
Este conclave acontece em meio a um contexto global desafiador para o catolicismo. A Igreja enfrenta debates internos sobre celibato, papel das mulheres, abusos sexuais encobertos e crise de vocações. O avanço da secularização na Europa e o crescimento do cristianismo evangélico em países da América Latina e África tornam a escolha do novo papa ainda mais estratégica.
Francisco, eleito em 2013, foi o primeiro pontífice vindo da América Latina e marcou seu pontificado por um tom pastoral, abertura ao diálogo inter-religioso e defesa da justiça climática e social. Seu sucessor herdará um rebanho de mais de 1,3 bilhão de fiéis e o desafio de unir uma instituição que, embora milenar, precisa se reinventar para sobreviver ao século XXI.
A fumaça e os sinais do tempo
Como manda a tradição, o mundo aguardará a fumaça branca para conhecer o 267º sucessor de Pedro. Mais do que um nome, o novo papa simbolizará um posicionamento: entre a continuidade e a ruptura, entre a doutrina e a adaptação, entre Roma e as periferias.
Na eleição que se aproxima, as decisões tomadas dentro dos muros do Vaticano ecoarão por todo o planeta — e podem redefinir o papel da fé católica no cenário geopolítico e cultural dos próximos anos.
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