Os dados divulgados pelo Banco Central (BC) revelam um cenário desfavorável para a economia brasileira, apesar das declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre comprometimento com a responsabilidade fiscal. Segundo o BC, a dívida pública bruta voltou a crescer, atingindo níveis alarmantes para países emergentes.
A dívida pública bruta passou de 76,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em maio para 77,8% do PIB em junho, o maior patamar desde novembro de 2021, totalizando R$ 8,691 trilhões em valores nominais. Este aumento representa um acréscimo de R$ 612,2 bilhões sobre o saldo de dezembro de 2023.
Especialistas apontam que este resultado é consequência do afrouxamento das regras fiscais e do aumento expressivo dos gastos governamentais, resultando em um rombo fiscal superior ao registrado durante a pandemia da covid-19, entre 2020 e 2021. A taxa da dívida pública bruta em relação ao PIB é um indicador crucial da capacidade de um país honrar seus compromissos financeiros. No Brasil, ela continua a crescer devido ao ritmo acelerado dos gastos do governo em comparação com a arrecadação, resultando em déficits fiscais.
Conforme projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), a média de endividamento público em economias emergentes e países da América Latina é de 69% e 68% do PIB, respectivamente. No entanto, os números brasileiros superam essas médias.
Rombo histórico e reações do mercado
Os dados do BC também mostram que a necessidade de financiamento do setor público consolidado, que inclui os governos federal e regionais e as estatais, foi deficitária em R$ 1,107,9 trilhão no acumulado de 12 meses até junho, equivalente a 9,92% do PIB. Este foi o maior déficit nominal da história, superando o rombo de janeiro de 2021, que foi de R$ 1,016 trilhão.
O economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos, Eduardo Velho, comentou que o aumento persistente da dívida pública bruta não é surpresa, dado o contínuo crescimento do rombo fiscal. Segundo ele, os gastos públicos estão crescendo a uma taxa superior ao crescimento real da economia. Além disso, a necessidade de manter um aperto monetário devido à inflação acima da meta central de 3% também impacta no custo da dívida pública.
As declarações do presidente Lula sobre não gastar mais do que o governo arrecada foram recebidas com ceticismo por analistas e especialistas em contas públicas, especialmente às vésperas de uma nova reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC. A especialista em contas públicas Selene Peres Nunes questionou as afirmações do presidente, sugerindo que elas não correspondem à realidade fiscal do país.
Comparações internacionais e expectativas
Enquanto o Brasil caminha para uma dívida pública bruta de 80% do PIB, o Paraguai recebeu recentemente um selo de bom pagador da agência de classificação de risco norte-americana Moody's, algo que o Brasil perdeu em 2015. A classificação da Moody's para o Paraguai subiu para Baa3, o primeiro nível de grau de investimento, colocando o país vizinho à frente do Brasil neste aspecto.
O Banco Central inicia hoje a quinta reunião do Copom com o dólar mais valorizado e um cenário fiscal desafiador. Analistas da XP Investimentos destacam a necessidade de um contingenciamento de despesas superiores ao anunciado, devido à frustração com algumas medidas de elevação de receitas e à aceleração dos gastos obrigatórios. A previsão é que o centro da meta fiscal seja alterado de déficit zero para saldo negativo de 0,5% do PIB. O consenso entre os analistas do mercado é de manutenção da taxa básica de juros (Selic), atualmente em 10,5% ao ano, com a decisão esperada para ser unânime.