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Trump e os desafios ao governo Lula: redes sociais, meio ambiente e geopolítica econômica em disputa

A posse de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos inaugura um cenário desafiador para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Com implicações diretas em áreas como regulamentação das redes sociais, políticas ambientais e iniciativas econômicas internacionais, o novo governo republicano nos EUA pode criar obstáculos significativos para as principais pautas do Planalto nos próximos anos.

Regulamentação das redes sociais: o “efeito Trump” e a resistência global

A regulamentação das redes sociais no Brasil, proposta no chamado “PL da Censura”, enfrenta obstáculos crescentes. O texto visa responsabilizar as plataformas digitais por conteúdos considerados antidemocráticos, mas enfrenta forte oposição de parlamentares e resistência das Big Techs.

A recente decisão da Meta de descontinuar programas de checagem de fatos nos Estados Unidos, vista como parte do “efeito Trump”, intensifica os desafios. Segundo o cientista político Carlos Melo, professor do Insper, a postura de Trump, defensor ferrenho da liberdade irrestrita nas redes, cria um ambiente hostil para legislações que buscam regular plataformas digitais. “A narrativa da liberdade de expressão irrestrita, muitas vezes promovida como argumento para evitar regulações, influencia diretamente a opinião pública e cria barreiras para governos que buscam maior controle sobre conteúdos digitais”, analisa Melo.

Além disso, a indicação de Elon Musk, proprietário do X (antigo Twitter), para o Departamento de Eficiência Governamental dos EUA, é vista como uma ameaça à agenda regulatória do governo Lula. De acordo com a socióloga Esther Solano, especialista em comportamento digital, “a postura de figuras como Musk e Trump reforça a resistência global das Big Techs contra regulações, alinhando-as a discursos que dificultam qualquer iniciativa regulatória fora dos EUA”.

O governo Lula já articula alternativas no Supremo Tribunal Federal (STF), buscando um novo marco jurídico para responsabilizar as plataformas digitais. Em parecer recente, o ministro Jorge Messias, da Advocacia-Geral da União (AGU), destacou a urgência de tais medidas diante das mudanças internacionais. “A regulação digital é uma questão de soberania nacional. Precisamos agir antes que a influência externa inviabilize qualquer tentativa de controle”, afirmou Messias.

Agenda ambiental em xeque: COP-30 e o Fundo Amazônia sob risco

Outro ponto sensível é a política ambiental. A realização da COP-30 em Belém, em novembro de 2025, é uma das principais apostas internacionais de Lula, mas enfrenta incertezas com Trump de volta à Casa Branca. Durante seu primeiro mandato, Trump retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris e boicotou iniciativas climáticas globais. Agora, teme-se que o republicano repita a estratégia, esvaziando o evento e travando a definição de novas metas climáticas para 2035.

A cientista ambiental Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, alerta que a ausência de comprometimento dos EUA pode comprometer não apenas o financiamento climático, mas também o protagonismo de países emergentes. “Os países em desenvolvimento dependem do financiamento climático para adaptação e mitigação. Com Trump, será praticamente impossível avançar em compromissos financeiros, como os US$ 100 bilhões anuais prometidos aos países mais pobres”, destaca Unterstell.

Além disso, o Fundo Amazônia, que recebeu aporte de US$ 100 milhões do governo Biden, corre o risco de sofrer cortes com a nova administração. “Trump já demonstrou desinteresse por iniciativas de preservação florestal. Isso pode inviabilizar não apenas o Fundo Amazônia, mas também comprometer a reputação do Brasil como líder ambiental”, avalia Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas.

Retaliação econômica: o ataque ao dólar e o risco de tarifas comerciais

Outro grande impacto do governo Trump sobre o Brasil pode ocorrer na esfera econômica, especialmente em relação ao plano do BRICS de criar um sistema de pagamento alternativo ao dólar. Lula tem defendido a necessidade de diversificar os meios de pagamento entre os países do bloco, mas enfrenta resistência direta de Trump, que já sinalizou possíveis retaliações econômicas.

Em sua plataforma Truth Social, Trump afirmou que aplicará tarifas de 100% sobre países do BRICS que avançarem com propostas de substituir o dólar. “Isso é uma declaração de guerra econômica. O Brasil, como articulador dessa proposta, está na linha de frente para possíveis represálias”, analisa Rodrigo Zeidan, economista e professor da New York University Shanghai.

O chamado “BRICS Pay”, um sistema bancário alternativo ao SWIFT, é uma das bandeiras da presidência rotativa do bloco, atualmente liderada pelo Brasil. Segundo Zeidan, a maior preocupação de Trump é a ampliação da influência econômica da China, que usa o yuan digital como ferramenta para desafiar a hegemonia do dólar. “O Brasil precisa encontrar um equilíbrio delicado entre fortalecer sua posição no BRICS e manter boas relações comerciais com os Estados Unidos, seu segundo maior parceiro comercial”, conclui o economista.

Desafios futuros: o dilema entre autonomia e dependência

O retorno de Trump à presidência dos EUA inaugura um período de complexidade geopolítica para o governo Lula. Especialistas apontam que o Brasil precisará adotar estratégias criativas para driblar as influências do novo governo republicano, especialmente em áreas como tecnologia, meio ambiente e economia.

Segundo a cientista política Débora Lacerda, da Universidade de Brasília (UnB), o principal desafio de Lula será “preservar a autonomia do Brasil sem sacrificar relações estratégicas”. Ela enfatiza que o contexto global exige pragmatismo e capacidade de negociação. “A chegada de Trump representa um retrocesso em agendas fundamentais para o Brasil. O governo precisa agir rápido para evitar prejuízos irreversíveis.”

Com tantas frentes em jogo, o Planalto terá que navegar por águas turbulentas, equilibrando sua ambição de protagonismo internacional com a realidade de um cenário global cada vez mais polarizado.

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