Livro reúne peças teatrais que discutem bullying, violência e saúde mental entre jovens

“O amor de Pedro e Inês e outras peças incríveis para jovens”, de Rodrigo Rangel, transforma clássicos em pontes para debater dilemas da adolescência nas escolas públicas

Como uma tragédia medieval portuguesa pode dialogar com os conflitos vividos por adolescentes em uma escola pública do Rio de Janeiro? É essa a provocação central do livro “O amor de Pedro e Inês e outras peças incríveis para jovens”, do ator, professor de teatro e escritor Rodrigo Rangel. A obra reúne quatro peças dramáticas criadas a partir da vivência do autor em escolas da rede pública e trata, com sensibilidade e profundidade, de temas urgentes como bullying, saúde mental, redes sociais, violência urbana e identidade de gênero.

Inspirado em montagens teatrais feitas com alunos de comunidades periféricas, Rangel cruza referências da literatura clássica com a realidade escolar contemporânea, criando textos acessíveis e potentes para adolescentes, educadores e artistas. Em cada obra, o autor estabelece uma ponte entre o drama e a pedagogia, oferecendo espaço para reflexão, diálogo e transformação social.

A peça que dá nome ao livro coloca estudantes encenando a história trágica de Pedro e Inês de Castro enquanto enfrentam, do lado de fora da escola, o medo cotidiano da violência entre facções rivais. O texto propõe uma pergunta inquietante: o que realmente mudou desde o século XIV?. Para Rangel, a resposta passa pela arte como ferramenta de resistência.

“Se a bala é que está mandando lá fora, aqui dentro quem é a estrela é a criatividade. A nossa luta, a nossa resistência contra tudo de ruim que está aí fora é o teatro. Vamos transformar a realidade em arte”, escreve o autor na obra (p. 81).

As outras três peças aprofundam diferentes aspectos da juventude atual:

“Cyrano” é uma releitura do clássico Cyrano de Bergerac, de Edmond Rostand. Aqui, o protagonista é um adolescente introspectivo que, por vergonha de se declarar, empresta suas palavras ao amigo popular para conquistar a mesma garota. A narrativa expõe questões de autoestima, invisibilidade e o impacto das redes sociais no afeto adolescente.
Em “Dom Quixote: onde está o amor?”, o personagem-título é Quísia, um menino trans que se veste como cavaleiro medieval e tenta encantar o mundo com poesia. Ele enfrenta rejeição, bullying e violência, ao mesmo tempo em que sonha com um mundo onde possa existir livremente. A peça ressignifica o heroísmo e discute identidade de gênero com delicadeza e força.
Por fim, “Histórias de Arrepiar” apresenta quatro cenas curtas que usam o suspense e o terror para falar de automutilação, intolerância e marginalização. Misturando humor, crítica social e o imaginário das lendas urbanas, os textos criam atmosferas envolventes e reflexivas.

Além dos roteiros, a obra inclui artigos de especialistas em teatro e educação, como Tania Brandão, Liliane Mundim, Celso Taddei e Vitor Lemos, que ampliam o olhar pedagógico e reflexivo das peças, e servem como guia para uso em sala de aula ou projetos culturais.