As mudanças climáticas são o maior desafio da humanidade no século XXI, e o combate a elas é marcado por contradições alarmantes. Enquanto governos e líderes globais fazem promessas audaciosas para reduzir as emissões de carbono, a realidade aponta para um aumento da produção de carvão em vários países, especialmente na Ásia. O carvão mineral, maior fonte de emissões de dióxido de carbono (CO₂) no mundo, está no centro desse impasse. O que custaria eliminar o carvão do sistema energético global? E quem pagaria essa conta astronômica?
Durante uma análise transmitida pela CNBC Brasil, a ex-senadora Kátia Abreu, convidada especial do canal, trouxe dados contundentes e perspectivas críticas sobre o tema. “Apenas para desativar as mais de 7 mil usinas de carvão mineral no mundo, seria necessário um investimento de cerca de 6 trilhões de dólares. É um custo alto, mas que precisa ser analisado em perspectiva, considerando os danos que o carvão causa ao meio ambiente e à saúde pública”, afirmou Kátia. A discussão ganha ainda mais relevância ao considerar as dificuldades históricas de se obter acordos concretos em conferências climáticas, como as COPs.
Carvão mineral: vilão histórico do clima
O carvão mineral é responsável por cerca de 30% da geração de eletricidade global, mas sua queima responde por 95% das emissões de CO₂ provenientes do setor energético. Este recurso barato e abundante foi o motor da Revolução Industrial, mas seu uso massivo trouxe um legado sombrio de poluição e mudanças climáticas.
Os dados apresentados pela CNBC mostram que o maior consumidor global de carvão é a China, que abriga quase metade das usinas de carvão em operação no mundo. Apesar de seus esforços para diversificar a matriz energética, com investimentos pesados em energia solar e eólica, o país continua a depender do carvão para sustentar seu crescimento econômico. A Índia, outro grande consumidor, enfrenta desafios semelhantes, enquanto países desenvolvidos como Estados Unidos e Alemanha ainda utilizam o carvão em menor escala, mas com alta intensidade per capita.
O custo de descarbonizar: um dilema financeiro
A consultoria The Economist estima que encerrar as operações de todas as usinas de carvão no mundo exigiria cerca de 6 trilhões de dólares em indenizações aos proprietários. Esse cálculo inclui não apenas o valor das infraestruturas, mas também a compensação pela perda de lucros futuros.
Entretanto, adiar a desativação dessas usinas tem custos ainda maiores. A cada ano de operação, as emissões acumuladas aumentam, intensificando o aquecimento global. Dados indicam que enquanto custa 34 dólares evitar a emissão de uma tonelada de CO₂, retirar essa mesma quantidade da atmosfera pode custar até 600 dólares. Além disso, os desastres climáticos gerados pelo aquecimento global — como inundações, secas e incêndios florestais — já causam prejuízos anuais na casa das centenas de bilhões de dólares.
Brasil: potência renovável, mas com desafios
O Brasil desponta como um exemplo no uso de energias renováveis, com 85% da matriz elétrica proveniente de fontes limpas, como hidrelétricas, energia solar e eólica. “O Brasil é professor nesse tema. Nossa matriz elétrica é um modelo para o mundo, mas ainda enfrentamos desafios, como a distribuição de energia e a atração de investimentos para expandir as energias renováveis”, destacou Kátia Abreu.
No entanto, mesmo com seus avanços, o país enfrenta limitações na infraestrutura para ampliar a distribuição de energia renovável, especialmente nas regiões Norte e Nordeste. Essas áreas possuem grande potencial de geração, mas ainda carecem de linhas de transmissão eficientes para levar energia a outras regiões do país. Além disso, o Brasil precisa acelerar investimentos em tecnologias de armazenamento de energia, como baterias, para lidar com a intermitência das fontes solar e eólica.
A justiça climática e o dilema das indenizações
Uma das questões mais controversas no debate sobre o fim do carvão é a indenização às empresas que operam as usinas. Países em desenvolvimento, como a Índia e vários da África Subsaariana, argumentam que os países ricos — responsáveis pela maior parte das emissões históricas de CO₂ — deveriam arcar com os custos da transição energética.
Desde a Revolução Industrial, Europa e Estados Unidos foram os maiores emissores de carbono. Hoje, ainda lideram em emissões per capita, com a média de um cidadão americano emitindo 11 vezes mais CO₂ do que a média global. “Os países ricos têm uma dívida histórica com o planeta. Eles se beneficiaram do carvão para construir suas economias, enquanto os países pobres enfrentam os piores impactos das mudanças climáticas”, ressaltou Kátia.
Apesar dessas desigualdades, a transferência de recursos prometida em conferências climáticas ainda está longe de ser concretizada. Durante a COP26, por exemplo, foi difícil garantir até mesmo um trilhão de dólares para apoiar países vulneráveis. Como então financiar os 6 trilhões necessários para encerrar as operações de carvão?
O futuro da energia global
A transição energética global exige mais do que a substituição do carvão por fontes limpas. Ela depende de inovações tecnológicas, políticas públicas robustas e cooperação internacional. Energias como solar e eólica, que já foram consideradas caras e inviáveis, estão se tornando mais acessíveis graças aos avanços tecnológicos. No entanto, a instalação dessas tecnologias exige investimentos significativos em infraestrutura, como turbinas eólicas e placas solares.
O Brasil, com sua diversidade de fontes energéticas e recursos naturais abundantes, tem potencial para liderar essa transição. Mas para isso, precisará superar barreiras internas, como a burocracia e a falta de incentivos fiscais para projetos de energia renovável. Além disso, é fundamental que o país atraia investimentos estrangeiros, especialmente em tecnologias de ponta, como hidrogênio verde e biocombustíveis.
Uma solução urgente e complexa
O fim do carvão é, sem dúvida, uma das metas mais urgentes no combate às mudanças climáticas. Mas sua implementação envolve decisões complexas, que equilibram interesses econômicos, ambientais e sociais. A solução exige não apenas financiamento, mas também vontade política e solidariedade global. Afinal, o custo de não agir será muito maior — e irreparável.
“O carvão é um vilão que precisa ser eliminado, mas essa transição precisa ser justa. Não podemos colocar toda a carga sobre os países em desenvolvimento ou as populações mais vulneráveis. É um desafio global que exige responsabilidade compartilhada”, concluiu Kátia Abreu.
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