O Brasil deu um passo decisivo na medicina genética ao aprovar o uso de uma terapia inédita para tratamento de cânceres raros em crianças. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou o avanço dos testes clínicos da terapia CAR‑T, desenvolvida por instituições públicas como o Hemocentro de Ribeirão Preto e o Instituto Butantan. A técnica será utilizada em casos de leucemia linfoide aguda e linfoma não-Hodgkin, doenças que afetam principalmente o público pediátrico.
Como funciona a terapia CAR‑T
A sigla CAR‑T vem de “Chimeric Antigen Receptor T-Cell”, ou receptor de antígeno quimérico. O tratamento consiste em retirar células T do paciente, modificar seu DNA em laboratório para que reconheçam e ataquem células cancerígenas, multiplicá-las e reinfundi-las no organismo.
Diferentemente da quimioterapia tradicional, que atinge células saudáveis e exige múltiplos ciclos, a CAR‑T atua de forma precisa, em muitos casos com uma única aplicação. Os primeiros resultados mostram taxa elevada de resposta, com remissões completas em pacientes que já haviam esgotado outras opções terapêuticas.
O que dizem os especialistas
Para o oncologista pediátrico Dr. Ricardo Mendes, do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, a nova técnica representa um divisor de águas no tratamento infantil.
“É como se o sistema imunológico da criança fosse reprogramado para enxergar o tumor como inimigo e eliminá-lo. Estamos falando de uma chance real de cura para pacientes que antes não tinham mais alternativas.”
Segundo ele, os efeitos colaterais da CAR‑T são menores do que os registrados em terapias convencionais, embora haja necessidade de internação monitorada nos primeiros dias após a infusão das células.
Diferenças em relação ao tratamento convencional
A quimioterapia, principal abordagem até hoje, envolve aplicações frequentes, hospitalizações prolongadas e forte impacto na qualidade de vida da criança. Além disso, a taxa de recidiva é significativa em alguns tipos de câncer.
A CAR‑T, por sua vez, oferece uma abordagem personalizada, baseada no perfil imunológico de cada paciente. Embora o custo inicial ainda seja elevado, especialistas destacam que ele pode ser compensado pela alta eficácia e pela redução de internações futuras.
Impacto no SUS e na rede privada
Na rede privada, terapias genéticas como a CAR‑T já são oferecidas em hospitais de referência, mas com valores que superam os R$ 2 milhões por tratamento. Com a produção nacional de células modificadas, a expectativa é reduzir esse custo em até 90%, viabilizando a incorporação gradual ao Sistema Único de Saúde.
O Ministério da Saúde acompanha os estudos e avalia a criação de centros públicos habilitados para realizar a terapia em escala. A intenção é iniciar o atendimento de forma regionalizada, priorizando casos graves e recidivos.
Na prática, isso pode significar o início de uma nova era para a oncologia pediátrica brasileira: menos sofrimento, mais eficácia e maior equidade no acesso ao que há de mais avançado na medicina mundial
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