No cenário da moda brasileira, cresce o protagonismo de matérias-primas regionais que dialogam com sustentabilidade, ancestralidade e valorização do território. No Tocantins, elementos como a fibra de buriti, o capim dourado e o algodão orgânico se consolidam como símbolos da moda consciente e da produção artesanal com identidade, ocupando vitrines de coleções autorais e atraindo a atenção de designers nacionais.
Mais do que tendência, o uso desses materiais reflete uma mudança estrutural na cadeia produtiva da moda, que passa a incorporar valores como responsabilidade ambiental, ética no trabalho e conexão com comunidades tradicionais.
Buriti: a força da fibra e a resistência da cultura
Do caule da palmeira do buriti, típica do Cerrado e da Amazônia Legal, extrai-se uma fibra resistente, de textura firme e coloração natural dourada. Há décadas utilizada por comunidades quilombolas e ribeirinhas na confecção de redes, cordas e utensílios, a fibra de buriti ganha hoje novas leituras no design de moda.
A estilista tocantinense Lorena Reis, que há cinco anos desenvolve coleções com fibras naturais, destaca que o buriti é um símbolo de equilíbrio entre força e delicadeza. “A fibra exige tempo, cuidado e domínio de técnicas antigas. A gente não só veste buriti — a gente carrega uma história ancestral com ele. Eu uso nas alças de bolsas, em detalhes de vestidos e até em tramas de acessórios de cabeça”, afirma.
Além da resistência e estética rústica, o buriti se destaca por ser 100% biodegradável, colhido de forma extrativista e com baixa pegada ambiental.
Capim dourado: joia viva do Jalapão no design de moda
Outro protagonista do artesanato tocantinense, o capim dourado, colhido no Jalapão, transcendeu o artesanato tradicional e hoje integra coleções de moda urbana e de luxo. A associação com biojoias é a mais comum, mas o material também aparece em clutches, chapéus, palas, cintos e detalhes em calçados.
A designer de acessórios Patrícia Xavier, de Palmas, tem expandido o uso do capim dourado em parceria com artesãs de comunidades como Mumbuca e Prata. “A gente desenha junto. Elas trazem o saber ancestral e eu trago o olhar do design contemporâneo. O capim dourado já está no mercado internacional e pode ocupar a moda com protagonismo se houver valorização justa”, destaca.
Além de ser um material nobre, leve e resistente, o capim dourado representa renda para mulheres artesãs, muitas delas chefes de família, e reforça o papel do design como ponte entre tradição e inovação.
Algodão orgânico: agricultura familiar e rastreabilidade na produção têxtil
Embora menos visível que o capim dourado, o algodão orgânico cultivado no Tocantins tem ganhado espaço em cooperativas e confecções sustentáveis. Diferentemente do algodão convencional, o orgânico é cultivado sem agrotóxicos, com manejo agroecológico e foco na rastreabilidade.
A designer goiana Carla Mendonça, que já participou do São Paulo Fashion Week com peças feitas com algodão tocantinense, defende que o futuro da moda passa pela conexão direta entre quem planta, quem costura e quem veste. “Quando você sabe quem fez a sua roupa, e com que fibra ela foi feita, a roupa passa a ter alma. E o algodão orgânico do Cerrado carrega essa energia viva da terra e das mãos que cuidam dela”, afirma.
Cooperativas como a Coopaer (Cooperativa dos Produtores Agroecológicos do Cerrado Tocantinense) têm sido fundamentais para viabilizar essa produção, conectando moda, agricultura familiar e responsabilidade socioambiental.
Moda com identidade, propósito e futuro
A ascensão do capim dourado, da fibra de buriti e do algodão orgânico no universo da moda é reflexo de um movimento maior: o de busca por produtos com propósito, que respeitem o meio ambiente e valorizem a cultura local.
Eventos como o Festival Gastronômico e Cultural de Taquaruçu, em Palmas, e o Brasil Eco Fashion Week, em São Paulo, têm dado visibilidade a designers do Tocantins e promovido o intercâmbio entre tradição e inovação. A expectativa, segundo especialistas, é que o estado consolide-se nos próximos anos como referência em moda sustentável com base regional.
“Temos todas as ferramentas: matéria-prima de excelência, talento criativo, saberes populares e urgência ambiental. A moda do Tocantins não é só estética — é política, é território, é futuro”, conclui a pesquisadora em moda e cultura popular Laís Barros.
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