Conversas ocorrem após presidente russo recusar participação em negociações de paz com o líder ucraniano na Turquia; especialistas apontam tentativa de reposicionamento dos EUA no conflito
Por Fernanda Cappellesso
Para o Diário Tocantinense
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou nesta segunda-feira (19) que telefonou aos presidentes da Rússia, Vladimir Putin, e da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, com o objetivo de interromper o que classificou como um “banho de sangue” na Europa Oriental. As conversas ocorreram em meio ao endurecimento dos confrontos no leste ucraniano e à recusa formal do Kremlin em participar de novas negociações de paz, que seriam realizadas na Turquia.
Trump relatou que os telefonemas foram longos e “muito francos”. Segundo ele, tanto Putin quanto Zelensky reconheceram a escalada trágica da violência, mas não houve, até agora, sinalização concreta de um cessar-fogo.
— O número de mortos está fora de controle. Pedi aos dois líderes que pensem nas mães, nas crianças, nas cidades destruídas. É hora de parar com esse banho de sangue — declarou Trump a jornalistas em Washington.
Putin rejeita mediação e reforça posição russa
A ligação com Putin ocorreu dias após o presidente russo rejeitar o convite da Ucrânia para uma rodada de negociações na Turquia, sob mediação internacional. Segundo fontes do Kremlin, Moscou considera que qualquer mesa de diálogo só pode ocorrer com o reconhecimento, por parte de Kiev e do Ocidente, da anexação formal dos territórios de Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporíjia.
— O Kremlin segue irredutível em suas demandas. A recusa em negociar na Turquia mostra que Putin ainda vê ganhos militares possíveis antes de qualquer concessão diplomática — analisa a professora Elena Orlova, especialista em geopolítica russa pela Universidade Estatal de Moscou.
Zelensky reforça apelo por apoio internacional
Do lado ucraniano, o presidente Volodymyr Zelensky teria sinalizado abertura ao diálogo, mas apenas em condições que respeitem a soberania territorial da Ucrânia. Segundo relatos do governo ucraniano, Trump também foi informado de que Kiev espera mais apoio dos Estados Unidos em ações concretas de dissuasão à ofensiva russa.
— Zelensky tenta manter a legitimidade internacional da causa ucraniana, mas se vê isolado diante da resistência russa e da hesitação de aliados — pontua Daniela Neves, professora de Relações Internacionais da FGV.
Zelensky sugeriu que futuras conversas ocorram em fóruns neutros, como o Vaticano ou Genebra, com presença da ONU e mediação do Papa Francisco, cuja equipe já havia manifestado interesse em interceder no conflito.
Análise: Trump busca protagonismo estratégico, mas enfrenta limites
A iniciativa de Trump foi recebida com cautela por diplomatas europeus. Apesar de ocupar novamente a presidência dos Estados Unidos desde janeiro de 2025, o republicano enfrenta resistência no cenário multilateral, especialmente por ter esvaziado fóruns como a OTAN e o G7 em seu primeiro mandato.
— Trump tenta capitalizar uma imagem de pacificador num momento em que sua política externa ainda é marcada por nacionalismo e instabilidade institucional. É simbólico, mas ainda carece de estrutura — explica Thomas Grayson, professor da Universidade de Georgetown.
Embora a Casa Branca tenha evitado detalhar o conteúdo das conversas, o Departamento de Estado afirmou que “quaisquer esforços que levem à redução da violência serão acompanhados com atenção”.
Mais de três anos de guerra e impasse
O conflito entre Rússia e Ucrânia, iniciado em fevereiro de 2022, já ultrapassa 1.200 dias e deixou um saldo estimado em mais de 500 mil mortos entre civis e militares. Os bombardeios mais recentes atingiram áreas industriais em Kharkiv e infraestrutura energética em Odessa, enquanto forças russas avançam lentamente no leste do país.
A possibilidade de negociações diretas entre Moscou e Kiev parece distante. Especialistas apontam que a ligação de Trump pode criar um espaço diplomático, mas alertam que sem concessões concretas de ambos os lados, qualquer cessar-fogo será superficial.
— Nenhum dos dois líderes quer parecer fraco. E ambos ainda veem a guerra como ferramenta de barganha política — conclui a analista militar Marina Rios, do Instituto Internacional de Segurança de Estocolmo.
Enquanto isso, o “banho de sangue” continua. E a paz, mais uma vez, parece adiada.
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