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OPINIÃO | A quem pertence o sucesso? O desabafo de Matheus, da dupla Matheus & Kauan, e o debate sobre direitos autorais, patrimoniais e morais na música brasileira

Por Fernanda Cappellesso

O vídeo viralizou. Nele, Matheus, da dupla Matheus & Kauan, desabafa após descobrir que uma de suas composições foi regravada por outro artista sem a devida autorização. A resposta do intérprete regional não demorou: “A gente estoura a música na região”. Com essa frase, ele tentou justificar uma prática antiga, mas cada vez mais questionada — a regravação de sucessos nacionais por artistas locais, sobretudo no Nordeste, sem consulta aos autores, sem contrato, sem negociação. O episódio reacendeu uma discussão séria: até onde vai o direito de interpretar uma obra alheia? E mais importante — de quem é a música?

O Brasil tem uma legislação sólida sobre direitos autorais, que se dividem em duas esferas fundamentais: o direito moral e o direito patrimonial. O primeiro garante ao autor o reconhecimento pela obra e a proteção contra modificações que deturpem sua criação. O segundo — e mais ignorado nesses casos — garante ao compositor o controle econômico da música. Ou seja: é ele quem detém a posse legal da obra e deve autorizar, formalmente, qualquer gravação, adaptação ou exploração comercial.

Quando um artista regrava uma canção sem autorização, não está apenas cometendo uma “falta de educação” com quem compôs. Está violando a lei. E a violação não se resolve com o pagamento automático do ECAD — a entidade que arrecada e distribui valores de execução pública. O ECAD remunera o uso de músicas já lançadas e autorizadas. Ele não substitui o dever de pedir autorização prévia ao titular dos direitos patrimoniais. Nem muito menos o direito moral de ser consultado sobre como sua obra será interpretada, remixada ou apropriada.

O desabafo de Matheus, portanto, dá voz a um incômodo antigo no meio artístico. Não é de hoje que compositores sertanejos — cujas músicas ocupam o topo das paradas nacionais — têm suas obras rearranjadas em ritmo de arrocha, piseiro ou forró eletrônico, apresentadas em clipes ou DVDs como se fossem inéditas. O pior: muitas vezes, sem sequer o nome do autor em destaque.

É importante frisar: essas músicas não são “descobertas” por artistas locais. Elas já são sucessos consolidados. Foram lançadas por nomes como Luan Santana, Jorge & Mateus, Matheus & Kauan, Vitor & Leo. São hits com projeção nacional e, em alguns casos, internacional. Dizer “a gente estoura na região” é, na prática, admitir o uso de uma criação que já nasceu estourada — mas sem os devidos créditos e acordos.

O que está em jogo aqui não é apenas uma disputa estética ou de mercado. É o futuro da cadeia criativa da música brasileira. Compositores como Zezé Di Camargo já declararam publicamente que não liberam mais seus catálogos para regravações por entenderem que esses materiais têm valor estratégico — são base para projetos especiais, turnês, DVDs. Luan Santana segue a mesma lógica: detentor de um dos repertórios mais fortes da nova geração, tem adotado postura criteriosa em relação ao uso de suas composições. Não por vaidade. Por planejamento de carreira e valorização da obra.

É hora de o mercado — especialmente o regional — compreender que o fato de uma música estar disponível na internet não significa que ela está disponível para uso. Playback, base instrumental, cifra, clipe no YouTube — nada disso equivale à autorização legal. Regravar uma música exige contrato. E contrato exige respeito.

No fim das contas, o que Matheus vocalizou não é apenas um lamento de um compositor prejudicado. É um chamado à profissionalização e à ética. A música tem dono. E enquanto o mercado insistir em desrespeitar isso, cada hit transformado em versão não autorizada deixará de ser sucesso — e passará a ser usurpação. É preciso repensar. Antes que a liberdade criativa acabe sufocada pela permissividade comercial.

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