O Instituto Butantan iniciou a fase final dos testes clínicos da vacina tetravalente contra a dengue, desenvolvida para proteger contra os quatro sorotipos do vírus. A medida ocorre em meio à reintrodução em larga escala do sorotipo 3 (DENV-3), que não circulava de forma significativa no Brasil há cerca de 17 anos. Em 2025, o vírus voltou a ser detectado com força em cinco estados: São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Amapá e Tocantins.
O avanço da variante DENV-3 acende um sinal de alerta nas autoridades sanitárias. Dados do Ministério da Saúde indicam mais de 170 mil casos prováveis de dengue apenas no início deste ano, com predominância crescente do sorotipo 3 em regiões com baixa exposição anterior. A preocupação se concentra sobretudo no risco de infecção secundária, que pode levar a quadros mais graves da doença.
A vacina desenvolvida pelo Butantan é do tipo viva atenuada e foi desenhada para ser aplicada em dose única. Em fases anteriores de testes clínicos, demonstrou eficácia geral de 79,6%, com maior proteção entre indivíduos que já tiveram contato prévio com o vírus. A proteção também foi considerada satisfatória para pessoas soronegativas, com eficácia acima de 70%.
Mais de 16 mil voluntários participam da fase 3 em centros de pesquisa espalhados por diversas regiões do país. Os participantes são acompanhados por dois anos, com foco na eficácia, nos efeitos adversos e na capacidade de resposta imunológica do organismo após a aplicação da dose.
Segundo o infectologista Alexandre Naime Barbosa, da Sociedade Brasileira de Infectologia, o cenário atual exige pressa, mas também responsabilidade científica. “O sorotipo 3 tem potencial de causar epidemias porque muitas pessoas hoje não têm anticorpos contra ele. A vacinação pode mudar esse quadro, mas precisa ser implementada com cautela e transparência quanto aos dados clínicos”, alerta.
O especialista também chama atenção para o fenômeno conhecido como amplificação dependente de anticorpos (ADE, na sigla em inglês), que pode tornar a infecção secundária mais grave em quem já teve dengue anteriormente. Por isso, reforça-se a importância de vacinas com eficácia balanceada entre os diferentes sorotipos.
O Instituto Butantan já enviou pedido de registro da vacina à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A previsão é que a análise regulatória seja concluída ainda em 2025. Com o aval, o imunizante poderá ser incluído no calendário do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir de 2026.
Atualmente, o Brasil já conta com a vacina Qdenga, produzida por um laboratório internacional e aprovada em 2023. No entanto, a produção nacional da vacina do Butantan, sem necessidade de importação, pode ampliar o acesso e reduzir os custos para o sistema público de saúde.
No Tocantins, um dos estados em alerta máximo, a circulação do DENV-3 preocupa pela possibilidade de surtos regionais. Embora o estado não seja um dos polos centrais dos testes clínicos, ele está no radar das autoridades como área prioritária para futuras campanhas de vacinação.
A expectativa é que, com a conclusão da fase 3 e a liberação pela Anvisa, o Brasil passe a contar com duas vacinas disponíveis contra a dengue. O desafio será logístico: garantir a distribuição em regiões mais afetadas, integrar a vacina à rotina de imunização e conscientizar a população sobre a importância da prevenção.
Link para compartilhar: