Por Fernanda Cappellesso*
Não é raro que a opinião pública global, governos ocidentais e grandes veículos de imprensa se unam em solidariedade irrestrita a Israel sempre que o país entra em conflito com seus vizinhos. Basta um ataque contra Tel Aviv para que monumentos sejam iluminados com a estrela de Davi, chefes de Estado emitam comunicados firmes e redes sociais inundem-se de campanhas comoventes.
Mas quando a ofensiva parte de Israel — e atinge hospitais em Gaza, acampamentos de refugiados no Líbano ou instalações civis na Síria — a reação costuma ser discreta, burocrática, adormecida. O silêncio torna-se protocolo. A compaixão desaparece.
O mundo não torce. Ele escolhe. E escolhe Israel.
Essa escolha, embora raramente declarada em voz alta, está na estrutura dos discursos e no peso das respostas. É uma escolha que atravessa a história, a geopolítica e a cultura, moldando a forma como tragédias são percebidas e como vítimas são hierarquizadas.
O trauma europeu e a blindagem política de Israel
Israel nasceu sob a sombra do Holocausto — um trauma profundo e irredimível da história ocidental. Desde então, qualquer crítica mais contundente ao Estado israelense é rapidamente associada a antissemitismo, numa confusão que protege políticas de guerra sob o manto da memória das vítimas. Essa blindagem moral tem um custo: impede a crítica, desumaniza o outro lado e permite atrocidades em nome da segurança.
O Irã, por outro lado, aparece no imaginário ocidental como um país fechado, repressivo, fanático. Essa representação — muitas vezes alimentada pelo próprio regime iraniano — torna mais fácil justificar sanções, bombardeios e assassinatos seletivos. Afinal, quem se sensibiliza por uma teocracia?
Mas o Oriente Médio não se resume ao embate entre uma democracia e um regime autoritário. Reduzir o conflito a essa dicotomia é ignorar décadas de ocupações, embargos, sabotagens, mortes civis e interferências externas.
As vítimas que não comovem fora de Israel
Há uma pergunta incômoda que pouco se faz: por que a morte de uma criança israelense choca mais do que a de uma criança palestina, libanesa ou iraniana? Por que determinadas vidas são imediatamente reconhecidas como dignas de luto e de justiça — enquanto outras precisam provar que não são terroristas, que não estavam “no lugar errado”, que eram civis “de verdade”?
A seletividade da empatia global é brutal. As lágrimas parecem ter bandeira. A indignação, passaporte diplomático. E a solidariedade, um filtro ideológico.
A neutralidade que nunca existiu
Não há neutralidade possível quando se escolhe o silêncio diante de um massacre. Tampouco há paz quando só se exige contenção de um dos lados. A cada novo bombardeio israelense, as potências falam em “resposta proporcional”. Mas o que é proporcional quando se trata de centenas de mortos civis em campos de refugiados? Qual é o limite da retaliação?
O Irã, evidentemente, não é um país pacífico nem transparente. Mas essa constatação não pode servir de escudo para ignorar os abusos de Israel — especialmente quando o país opera com apoio militar e político irrestrito das maiores potências do mundo.
A verdadeira pergunta não é por que o mundo defende Israel. Mas por que ele se cala quando Israel erra. Porque uma democracia também comete crimes de guerra. Um aliado também precisa de limites. E a paz não será construída com aplausos seletivos, nem com campanhas unilaterais.
Enquanto os conflitos forem narrados com torcida, a justiça continuará mutilada. E enquanto a empatia depender de quem dispara primeiro — ou de qual bandeira carrega — o mundo não estará mais próximo da paz. Estará apenas mais confortável em sua própria hipocrisia.
Fernanda Cappellesso é Jornalista, publicitária, mestre em Ciências Políticas, com MBA em Marketing Digital e Marketing Eleitoral. Especialista em SEO e posicionamento estratégico no Google*
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