Mauro Mendes sanciona lei que permite criação de gado em áreas de proteção permanente, colocando em risco a conservação do Pantanal Mato-Grossense. Especialistas denunciam retrocesso ambiental e alertam para possível aumento de incêndios.

Redação

 

O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil), sancionou na última quinta-feira (19) uma lei que autoriza a utilização de áreas de proteção permanente (APPs) para pecuária extensiva na Bacia do Alto Paraguai, região que integra o Pantanal Mato-Grossense. A medida, publicada no Diário Oficial do estado nesta sexta-feira (20), foi justificada como forma de "reduzir a biomassa vegetal combustível e, assim, mitigar os riscos de incêndios florestais".

A nova legislação permite a criação de gado em áreas de reserva legal da planície alagável, desde que sejam respeitados alguns critérios, como a proibição do plantio de gramíneas exóticas e a descaracterização da vegetação nativa. A proposta foi enviada pelo próprio Executivo estadual e aprovada pela Assembleia Legislativa.

A Bacia do Alto Paraguai, conhecida como "cabeceira do Pantanal", é uma das áreas mais sensíveis do bioma, segundo nota técnica emitida em julho por organizações ambientais. O documento alerta para a importância da região na preservação do regime hídrico do Pantanal e sua relevância para a conservação ambiental.

Em contrapartida, especialistas criticam a medida. Pedro Ivo Batista, educador ambiental e coautor da Carta da Terra no Brasil, classificou a lei como uma violação ao artigo 225 da Constituição, que assegura o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. "A situação do Pantanal já é crítica. Essa autorização coloca em risco a existência das cabeceiras do bioma", afirmou ao Congresso em Foco.

Débora Calheiros, pesquisadora da Embrapa Pantanal cedida ao Ministério Público Federal, também questionou a eficácia do uso de gado para controle da biomassa. "A quantidade de gado não é suficiente para reduzir a biomassa em uma escala que beneficie o bioma como um todo", explicou.

Outro ponto controverso da lei é a permissão para a instalação de empreendimentos de médio e alto impacto ambiental nas planícies alagadas, desde que submetidos a licenciamento ambiental. A pesquisadora alertou para a falta de critérios claros que definam esses impactos, o que pode fragilizar ainda mais a proteção ambiental da região.

O governo de Mato Grosso foi procurado pelo Congresso em Foco para comentar os fundamentos da sanção da lei e se tinha conhecimento da nota técnica emitida sobre o tema, mas até o momento não se pronunciou.

Denúncia de impacto ambiental

A sanção ocorre em meio a uma série de denúncias de flexibilização da legislação ambiental em Mato Grosso. Em agosto, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que o Pantanal está em risco de desaparecer devido ao avanço de atividades econômicas e à falta de políticas de proteção efetivas.

A nova lei do governo Mauro Mendes se insere em um contexto de ações políticas que, segundo especialistas, enfraquecem a preservação ambiental em benefício do agronegócio. "Não podemos ficar à mercê do interesse econômico que prioriza o lucro em detrimento do meio ambiente", criticou Pedro Ivo Batista.

O Pantanal, que sofre com incêndios recorrentes e a expansão agropecuária, tem enfrentado um processo de degradação acelerado. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o bioma perdeu cerca de 15% de sua cobertura vegetal apenas nos últimos cinco anos. A aprovação da Lei nº 12.653/2024, que flexibiliza o uso de APPs, representa um retrocesso na proteção da maior área alagável do planeta.

Impacto ecológico

A bióloga Débora Calheiros destacou que a abertura de pastagem nas áreas de sub-bosque das APPs ameaça a regeneração das espécies arbóreas, fundamental para a manutenção do bioma. "O consumo da vegetação pelo gado mata a possibilidade de renovação das espécies, comprometendo o equilíbrio ecológico do Pantanal", afirmou.

O risco de incêndios, frequentemente atribuído ao manejo inadequado de pastagens, também preocupa os pesquisadores. Sem uma fiscalização rigorosa e critérios bem definidos para a utilização das APPs, há o temor de que a prática acabe exacerbando as queimadas na região, ao invés de mitigá-las.

Próximos passos

O Ministério Público Federal (MPF) e organizações ambientais já estudam medidas legais para contestar a lei. Em nota, o MPF afirmou que a autorização de atividades econômicas em áreas de preservação permanente fere o princípio constitucional da preservação ambiental, e que ações judiciais poderão ser movidas contra a legislação.

A sociedade civil e organizações ambientais continuam pressionando o governo estadual para reverter a medida e reforçar as políticas de proteção ao Pantanal, um dos biomas mais ricos e ameaçados do país.

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